ALCOOLISMO

Publicado na Revista JM Magazine, n.º16 - Dezembro/2006

por Daniel Hercos (*)

 

(*) Membro titular da Associação Brasileira de Psiquiatria. Atua na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)


A pessoa que consome bebidas alcoólicas de forma excessiva, ao longo do tempo, pode desenvolver dependência de álcool, condição esta conhecida como “alcoolismo”. Os fatores que podem levar ao alcoolismo são variados, podendo envolver fatores de origem biológica, psicológica, sociocultural.

"A dependência do álcool é um problema
freqüente, que atinge cerca de 5 a 10% da
população adulta brasileira".

A transição do beber moderado ao beber problemático ocorre de forma lenta, em geral, leva vários anos. Alguns dos sinais do beber problemático são: desenvolvimento da tolerância, ou seja, a necessidade de beber cada vez maiores quantidades de álcool para obter os mesmos efeitos; o aumento da importância do álcool na vida da pessoa; a percepção do “grande desejo” de beber e da falta de controle em relação a quando parar; síndrome de abstinência (aparecimento de sintomas desagradáveis por ter ficado algumas horas sem beber) e o aumento da ingestão de álcool para aliviar a síndrome de abstinência.

A síndrome de abstinência do álcool é um quadro que aparece pela redução ou parada brusca da ingestão de bebidas alcoólicas após um período de consumo continuo. A síndrome tem inicio 6-8 horas após a parada da ingestão de álcool, sendo caracterizada pelo tremor das mãos, acompanhado de distúrbios gastrintestinais, distúrbio de sono e um estado de inquietação geral (abstinência leve).

Cerca de 5% dos que entram em abstinência leve evoluem para a síndrome de abstinência grave ou “delirium tremens” que, alem da acentuação dos sinais e sintomas acima referidos, caracteriza-se por tremores generalizados, agitação intensa e desorientação no tempo e espaço.

Os indivíduos dependentes do álcool podem desenvolver varias doenças. As mais freqüentes são as doenças do fígado (esteatose hepática, hepatite alcoólica e cirrose). Também são freqüentes problemas do aparelho digestivo (gastrite, síndrome de má absorção e pancreatite),no sistema cardiovascular (hipertensão e problemas no coração). Também são freqüentes os casos de polineurite alcoólica, caracterizada por dor, formigamento e caimbras nos membros inferiores. Durante a gestação pode trazer graves conseqüências para, o álcool também passa para o bebê na amamentação.

O Código Nacional de Trânsito

A ingestão de álcool, mesmo em pequenas quantidades, diminui a coordenação motora e os reflexos, comprometendo a capacidade de conduzir veículos. Pesquisas revelam que grande parte dos acidentes são provocados por motoristas que haviam bebido antes de dirigir. Segundo o Código Nacional de Transito (Janeiro de 1998) devera ser penalizado todo o motorista que apresentar mais de 0,6 gramas de álcool por litro de sangue.


"A quantidade de álcool necessária para atingir essa concentração no sangue e equivalente a beber cerca de 600 ml de cerveja (duas latas de cerveja ou três copos de chopp), 200 ml de vinho (duas taças) ou 80 ml de destilados (duas doses)".



No limiar dos nossos olhos...

A negação do próprio alcoolismo, quando ele não é evidente ou esta começando é uma forma de defesa da auto-imagem (aquilo que pensamos de nós mesmos), a embriaguêz compromete o intelecto e cria mil disfarces junto ao espelho. Muito além de uma visão sinistra esta doença surge atrás dos escombros ocultos onde residem nossas inquietações, receios e desencantos que se juntam na dita “dor da vida”.

Uma das vertentes mais importantes envolvidas na origem desta patologia é o comprometimento da célula elementar e fundamental de toda estrutura social, a família. A desagregação deste pilar de sustentação, representa hoje um dos fatores mais importantes para que se crie o terreno propicio onde vão crescer o consumo de álcool, drogas e violência que este fenômeno gera. Na verdade este pequeno território é nosso campo de treinamento como seres humanos, por ele somos parcialmente moldados e assim condenados ou salvos.
Seria importante a transformação e multiplicação de afetos, deixar de lado nosso egoísmo na busca de maturidade e equilíbrio. Por que somos imperfeitos podemos melhorar, aprender novas formas de convívio e amor, superar a servidão do corpo e da alma ao quebrar pedras e abrir caminhos, talvez construir castelos na luta para se libertar do álcool ou de qualquer outra droga.
Precisamos estabelecer limites, romper com a perplexidade, reavaliar nossa negligência em uma questão que pode acionar sem que a gente queira ou espere, os gatilhos da tragédia e da morte, afinal cada um de nós compõe sua história e cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz. No alcoolismo fármacos como a “naltrexona” e o “acamprosato” são úteis, mas na verdade funcionam apenas como coadjuvantes de um tratamento bem mais profundo que envolve a luta pessoal contra a aflição da alma pela bebida.


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