Melancolia (Durero, 1514)


DOENÇA DE SOMBRAS E ALMAS



Por Daniel Hercos (*)


Publicada na JM Magazine n.º8
em Dezembro/2004

 

A depressão está situada entre as patologias psiquiátricas mais difundidas na população geral. A porcentagem de indivíduos que poderiam desenvolver a doença no caso em que atingissem uma determinada idade é estimada em 0,5% e 18%, com valores médios que situam-se em 5%. A depressão pode ser avaliada na forma de um episódio único, porém muito mais frequente na forma múltipla, intercalados por períodos de bem estar, sendo, desta forma definida como doença episódica ou mais adequadamente recorrente.
O indivíduo afetado pela depressão apresenta transtornos no âmbito afetivo, alteraçoes mentais e físicas, que ocasionam problemas graves em todas áreas da funcionalidade, com evidentes repercussões na esfera de relação social e profissional. Por estes motivos, a depressão é considerada uma doença muito incapacitante, especialmente em decorrência do sofrimento moral envolvido. Além do mais o acentuado grau de sofrimento psíquico demonstra repercussão também sobre os indivíduos que estão em relação com o paciente deprimido e que sentem-se totalmente impotentes frente a patologia.

O MARTELO DE BRUXA - "MALLEUS MALEFICARUM"

Na idade média e no ínicio do renascimento a “Demonologia” (Séc.XV e XVI) inspirava os piores excessos, grandes resistências tiveram que ser vencidas para que se aceitasse a idéia de que as “FEITICEIRAS” e os

“POSSUIDOS” pudessem estar sofrendo de uma doença natural (A depressão quando grave apresenta quadro clínico caracterizado por delírios e alucinações frequentemente de conteúdo religioso-místico). São Thomaz foi um dos apóstolos desta cruzada. Mais tarde durante os séculos XVI e XVII, a medicina mental conquistou seus direitos de cidadania.


“E MUITOS DOENTES ARDERAM NAS FOGUEIRAS DA INQUISIÇÃO!”


Publicado em 1486, o Malleus Maleficarum (O Martelo de Bruxa) foi um dos livros mais infames escritos, servia de guia de viagem para inquisidores para ajudar na identificação, acusação e morte de bruxas. É um dos trabalhos mais sangue encharcados em história humana, sua existência reforçou e validou convicções católicas que na época conduziram a tortura e assassinato de milhares de doentes inocentes, homens, mulheres e até mesmo crianças que sofreram e morreram nas mão dos inquisidores durante este período da idade média.

 

AS MÁSCARAS DA DEPRESSÃO

O quadro mais típico (tristeza), pode ser mascarado por outras queixas tidas como, hipocondríacas (“mania de queixar doença”)

No diagnóstico da depressão levam-se em conta:

1 - SINTOMAS PSIQUICOS:
• Humor depressivo (sensação de tristeza, autodesvalorização e sentimentos de culpa).
• Redução na capacidade de experimentar prazer na maior parte das atividades antes consideradas como agradáveis.
• Fadiga ou sensação de perda de energia (lentifica-se o tempo para execução das tarefas)
• Diminuição da capacidade de pensar, de se concentrar ou de tomar decisões.

2 - SINTOMAS FISIOLOGICOS
• Alterações do sono (insônia com freqüência, podendo ocorrer sonolência em alguns casos)
• Alterações do apetite (perda do apetite, ou aumento pode acompanhar o quadro, sobretudo para massas e doces)
• Redução do interesse sexual

3 - ALTERAÇÕES DO COMPORTAMENTO
• Retraimento social
• Crises de choro
• Tendências suicidas
• Retardo ou agitação psicomotora


Quatro ou mais destes sintomas indicam um
quadro depressivo:

     
     
     
 
     

Doença verdadeira não se trata apenas com força de vontade!

 

É preciso derubar preconceitos: Viver com alegria é tudo de bom!

 


D
esacreditada como doença orgânica o distúrbio depressivo sofre todo tipo de obstrução ao tratamento.
Muitos são os recursos dados pela evolução das terapias medicamentosas. Nas décadas de 60 e 70, dispunhamos basicamente dos antidepressivos, tricíclicos, obtinha-se resposta do organismo; mas os efeitos colaterais, muitas vezes, eram desastrosos: ganho de peso, náuseas e vomitos, taquicardia, disfunção sexual dentre outros.
Em fins da década de 80, novos farmacos fizeram uma revolução na psiquiatria, hoje podemos conduzir o tratamento pelo perfil clínico de cada paciente; uma vez que a doença não apresenta um quadro único.
As alterações colaterais são mínimas e facilmente manejadas. Medicações como a “fluoxetina”, “paroxetina”, “citalopran”, “bupropiona”, “mirtazapina”, “venlafaxina” dentre outras permitem que as pessoas retomem a alegria de viver de forma segura (antidepressivo não provoca dependência no organismo) e relativamente rápida.


(*) Membro titular da Associação Brasileira de Psiquiatria

 

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