D. Maria I

Por que a
história esqueceu?

  
Sob a coroa da Rainha Maria I; os 200 anos da chegada da Família Real ao Brasil!

 


Daniel Santos Hercos (*)


Nas comemorações dos 200 anos da chegada da Família Real Portuguesa  ao Brasil o nome da soberana do reino não aparece. D. Maria I teve seu reinado iniciado em 1777 e só deixou o trono com a morte em 1816. Seus pais eram os reis de Portugal "D.José I", da casa dos Bragança e a rainha "Mariana Vitória", filha do rei da Espanha "Felipe V", da dinastia dos Bourbon. Assim, foi ela a primeira soberana das Américas: proclamada "Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves" em 16 de dezembro de 1815.


Mas parece que a história  esqueceu....! Foi a primeira rainha em Portugal a exercer o poder efetivo e a  vigésima sexta soberana à subir ao trono. Seu primeiro ato no reino português foi à demissão e exílio da corte do Marquês de Pombal. Rainha amante da paz, dedicada a obras sociais, concedeu asilo a numerosos aristocratas franceses fugidos ao Terror da Revolução Francesa (1789). Teve assim o cognome de "A Piedosa”. Foi responsável pela reforma da Marinha Portuguesa, criou a Academia de Ciências e a Biblioteca Pública de Portugal, dentre outros feitos.

Mentalmente instável desde  1792, com os lutos pelo seu marido 1786 e seu filho, o príncipe herdeiro morto aos 26 anos em 1788; designou que o filho João tomasse conta dos assuntos de Estado. Obcecada com as penas eternas que o pai estaria sofrendo no inferno, por ter permitido a Pombal perseguir os jesuítas, o via como um monte de carvão calcinado. Era dada a melancolia e ao fervor religioso de forma excessiva. Com a eminente invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão. A rainha teve de embarcar à força. Mística, acreditava que estava indo para o próprio Inferno. Dos membros da realeza, porém, foi a que mais se manteve calma, chegando a declarar:

"Não corram tanto, vão pensar que estamos fugindo".

No Brasil, devido aos constantes surtos de agitação mental firmou-se o outro cognome "A Louca". Sobre ela várias histórias foram aqui contadas,mas sempre com teor pejorativo e hilário. Outras talvez mitológicas, como a da água de uma fonte específica no Rio de Janeiro, cujos efeitos terapêuticos curavam seus acessos de loucura. Morreu aos 82 anos nesta cidade no dia 20 de março de 1816 e teve seus restos mortais transladados para a "Basílica da Estrela" em Lisboa. Por ironia do destino foi obra construída pela própria rainha quando em solo português.                                        

Hoje na Biblioteca Nacional de Portugal, logo à entrada, está a estátua de D. Maria I, em mármore de Carrara, homenagem de seus súditos. Porquê a história do Brasil esqueceu  sua primeira soberana e única rainha? Na monarquia como na vida real, o respeito deveria ser hierárquico, ter problemas mentais não é demérito algum! Antes de D.João VI, D.Maria I teve sim a coroa do Brasil.           

 

(*) Titular da Associação Brasileira de Psiquiatria
Atua na Universidade Federal do Triangulo Mineiro (UFTM)

Publicado no Jornal da Manhã - 06/02/2008

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